CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE. TESES DE EXCESSO DE EXECUÇÃO E PRECLUSÃO. SÚMULAS 283 E 284 DO STF. EXECUÇÃO DE DESPESAS CONDOMINIAIS. IMÓVEL ALIENADO FIDUCIARIAMENTE. RESPONSABILIDADE DO DEVEDOR FIDUCIANTE. ARTS. 27, § 8º, DA LEI Nº 9.514/1997 E
1.368-B, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CC/2002. PENHORA DO IMÓVEL. IMPOSSIBILIDADE. BEM QUE NÃO INTEGRA O PATRIMÔNIO DO DEVEDOR FIDUCIANTE. PENHORA DO DIREITO REAL DE AQUISIÇÃO. POSSIBILIDADE. ARTS. 1.368-B, CAPUT, DO
CC/2002, C/C O ART. 835, XII, DO CPC/2015. 1. Ação de embargos à execução, ajuizada em 11/5/2021, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 26/8/2022 e concluso ao gabinete em 27/10/2022.
2. O propósito recursal é definir se é possível a penhora de imóvel alienado fiduciariamente, em ação de execução de despesas condominiais de responsabilidade do devedor fiduciante.
3. De acordo com o art. 105, III, “a”, da CRFB, não é cabível recurso especial fundado em violação de dispositivo constitucional ou em qualquer ato normativo que não se enquadre no conceito de lei federal.
4. A existência de fundamento do acórdão recorrido não impugnado, quando suficiente para a manutenção da decisão quanto ao ponto, impede o conhecimento do recurso especial. Súmula 283/STF. 5. A ausência de indicação do dispositivo violado impede o conhecimento do recurso especial quanto ao tema. Súmula 284/STF.
6. A natureza ambulatória (ou propter rem) dos débitos condominiais é extraída do art. 1.345 do CC/2002, segundo o qual “o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios”[LB1] (Resp 2.036.289 - RS (2022/0344164-7)
É possível a penhora de imóvel que tenha sido dado em garantia por alienação fiduciária?
Trazendo o problema à debate, a formalização de uma garantia real na modalidade alienação fiduciária, nos termos da Lei 9.514/97, segue um caminho que não se mostra simplista aos olhos daqueles que não familiarizados com a legislação. O caminho usual se dá com a compra de um imóvel pelo Comprador que, não tendo condições ou interesse em quitar à vista o preço do imóvel, contrata um financiamento, seja com o próprio Vendedor, seja com um agente financeiro.
Desta forma, o bem imóvel sai do âmbito de propriedade do Vendedor e entra no patrimônio do Comprador que, no mesmo ato jurídico, transfere a propriedade resolúvel do imóvel ao Credor Fiduciário (agente financeiro ou próprio Vendedor), mantendo a posse direta do imóvel enquanto não quitar a dívida, passando a ser reconhecido como Devedor Fiduciante.
Desta forma, o debate se dava no sentido de ser possível penhorar o imóvel dado em garantia ao Credor Fiduciário por dívidas do Devedor Fiduciante, ou mesmo dívidas propter rem do próprio imóvel.
Havia entendimentos em ambos os sentidos, sendo que quem defendia a possibilidade desta penhora argumentava que, em que pese haver transmissão da posse resolúvel, a propriedade era ainda do Devedor Fiduciante, porquanto somente haveria a efetiva transmissão da propriedade ao Credor Fiduciário com a execução da garantia, nos termos dos arts. 26 e 27 da Lei 9.514/97.
A posição daqueles que não concordavam com tal posição era no sentido diametralmente oposto, ou seja, com o registro da alienação fiduciária o imóvel, o bem não mais integraria o patrimônio do Devedor Fiduciante para poder ser penhorado por suas dívidas, sendo que a expressão “propriedade resolúvel” da Lei traria, somente, o direito de retomada da propriedade plena do bem por mero ato burocrático de cartório (averbação da quitação da dívida garantia), não pendendo de outra anuência, contrato ou tributos para seu aperfeiçoamento.
A questão foi sanada com a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, a qual tratou-se do Recurso Especial nº(Resp 2.036.289 - RS (2022/0344164-7), interposto no âmbito de uma Ação de Embargos à Execução, cujo propósito foi determinar se é possível penhorar um imóvel alienado fiduciariamente para saldar débitos cobrados em Ação de Execução de Despesas Condominiais, sendo a responsabilidade do pagamento das dívidas condominiais atribuída ao Devedor Fiduciante.
Quanto ao mérito da questão, temos que a natureza dos débitos condominiais é regida pelo artigo 1.345 do Código Civil de 2002. Este dispositivo estabelece que o adquirente de uma unidade responde pelas dívidas do alienante em relação ao condomínio, incluindo multas e juros moratórios. No entanto, a discussão central debatida no v. acórdão se referiu à possibilidade de penhora do imóvel alienado fiduciariamente para pagamento daquela dívida do Devedor Fiduciante.
A decisão proferida pela Corte Superior no caso entendeu que o imóvel em questão, por estar gravado com o ônus da alienação fiduciária em garanti, não integra o patrimônio do Devedor Fiduciante enquanto a dívida não for quitada, pacificando a discussão acerca do debate sobre o que seria a dita “propriedade resolúvel” trazida pelo art. 22 da Lei 9.514/97, e portanto, não é possível penhorar o imóvel em si.
Doutra banda, a penhora dos direitos reais de aquisição que o Devedor Fiduciante tem foi considerada plenamente viável e satisfativa, porquanto passível de aferição patrimonial e praceamento, sendo respaldada pelos artigos 1.368-B, caput, do Código Civil de 2002, em conjunto com o artigo 835, XII, do Código de Processo Civil de 2015.
Dessa forma, a decisão destaca a distinção crucial entre o imóvel em si e o direito real de aquisição, permitindo que o condomínio execute a dívida ao penhorar o direito do Devedor Fiduciante sobre o imóvel e não do imóvel em si. Essa interpretação se alinha com a legislação vigente e fornece uma solução jurídica equitativa para o caso, preservando os direitos das partes envolvidas, em especial do Credor Fiduciante.
Texto por:
Giuliana Barberis
Leandro Farias
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